brincando de ser séria, poeminhas, tex(perimen)tos, tradução

um poema sobre a importância de estar só e de boa com isso às vezes

Tudo bem sentar a sós num café,
escrever num guardanapo sobre o seu dia
tomar chá e se apaixonar pelo jeito como você se apaixona
pelos outros
tomar um gole dos estranhos que passam,
ser gentil,
por favor seja gentil
viva a vida de olhos e braços abertos,
rodopie no meio do supermercado,
compre um pote de sorvete, às vezes,
mas só às vezes e
quebre a cara deles que nem um ovo
e faça o mais delicioso dos bolos
deixa eles sorrirem com você
e diga,
a vida não precisa ser vivida dentro dos cinzas.
sinta a sua humanidade se conectando através de um simples sorriso
ou um como vai você
e por favor não pergunte
como vai você
a não ser que isso flua de um rio de autenticidade
e realisticamente você terá momentos
nos quais o seu cérebro quer escapar do seu corpo
e seu corpo vai parecer uma prisão,
formando hematomas no seu crânio
mas
por favor abra a boca e bote a língua pra fora
e saboreie a vida como uma gota de chuva de verão
e saiba que tudo bem experimentar sabores azedos às vezes –
mas você tem que continuar a tentar.
more numa banheira por uma noite,
vá dormir só
e ponha a mão no peito
pra sentir o seu coração batendo
e respirar é algo que deixamos passar despercebido –
por favor não deixem uns aos outros passarem despercebidos.
Tudo bem usar batom
ou não usar.
Se apaixone por meninos, ou se apaixone por meninas,
mas por favor se apaixone pelo amor dentro de você.
Tudo bem sentir,
e se deixar cru e real
vivendo para os momentos em que lábios se expandem largo que nem um céu de pôr do sol de verão.
deixe rios de arrepios correrem pela sua espinha,
tudo bem chorar, também –
até as nuvens fazem isso.
Mas não é tudo bem ficar sentado em casa o dia todo,
desejando e esperando constantemente por alguém pra te salvar.
Apontando lâminas de barbear para a sua mente,
implorando para que alguém te queira.
Não é tudo bem nunca ficar a sós às vezes,
esconder lágrimas e nunca enxugar seus próprios olhos.
Essas coisas não são tudo bem.

(Tradução livre do poema de Abbie Young publicado pelo berlin-artparasites http://www.artparasites.com/a-poem-about-the-importance-of-being-alone-and-fine-with-it-sometimes/)

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poeminhas, tex(perimen)tos

oh Captain, my captain

Da varanda do primeiro andar calculo o
salto – sua língua é um trampolim
bambo: mergulho em vinho branco e afogo
os pulmões no cigarro que você
acendeu pra mim.

Submersa, a fumaça
exalada compete contra a luz
laranja dos postes
da rua Humaitá.

Juízes olímpicos me penalizariam
pelo estardalhaço da queda. Mas é
tão baixo, nem
dá pra morrer.

Eu só queria te ensinar o dó ré mi, como
se eu fosse Maria e você, uma criança
von Trapp. Mas eu me chamo
mesmo Maria e você
é o Capitão de
mim.

Sol dó lá fá mi dó ré
Sol dó lá si dó ré dó

Dó mi mi
Mi sol sol
Ré fá fá
Lá si si

(Trilha sonora de um estupro)

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um poema da sua ex-namorada para o novo amor da sua vida

Se ela te perguntar
Se ela te perguntar quem eu sou, conta pra ela. Conta pra ela
porque ela não tá pondo lenha na fogueira por uma explicação, ela só quer
uma confissão.

Se você disser pra ela que eu sou só uma garota com quem você ficou
por alguns anos, ela só vai te encher o saco.
As centenas de fotos nossas marcadas em tempos remotos da sua timeline e
a pilha
de livros com nossos nomes escritos vão ser as armas dela.

Se você disser pra ela que eu sou só uma antiga amiga, ela vai se fazer
de surda. Ela vai se lembrar de como você olhava
os lugares
com uma pontada de arrependimento e um quê de nostalgia. Ela vai
se lembrar
de como você pulava aquela música – um lembrete de algo
que você vai achar uma desculpa
pra esconder dela sempre que o rádio do carro estiver ligado.

Se ela te perguntar quem eu fui, conta uma mentirinha,
porque ela não tá passando dos limites atrás de respostas,
ela só quer afirmações.

Não conta pra ela como os nossos lábios brincaram com poesia e como
ousamos
sonhar sob a luz do satélite taciturno. Pula a parte
em que a gente
lutou juntos contra dragões e como a gente deu nomes pras cicatrizes
um do outro.

Omite o fato de que você ainda guarda as cartas, os bilhetes, as antigas
notas fiscais de restaurantes no fundo
das suas gavetas e alguns pensamentos manchados de lágrimas, no verso
do seu travesseiro. Ela não precisa saber
por que você releu conversas antigas nem por que sua mãe
mencionou meu nome num jantar da sua família
só pra descobrir como eu estava.

Por fim, se ela perguntar quem eu fui pra você, diz pra ela que você ama ela.
Põe ela nos holofotes
porque ela só está te testanto pra ver se você dispara o gatilho
apontado contra ela.

Mas você não vai. Em vez disso, você vai falar que ela é bonita, pra
compensar
pelas palavras que você nunca teve coragem de me dizer. Você vai falar
pra ela que ela é “pra casar”, só pra jogar papo fora.
Você vai contar pra ela sobre uma pesquisa precária sobre células humanas
serem substituídas após sete anos, de forma que um dia
seu corpo não terá mais nenhum resquício de mim.

Então ela vai esquecer que você falou meu nome durante
o sono. Ela vai lavar as marcas de batom
dos seus lençóis e descartar a escova de dentes extra no
box do banheiro. Ela vai ignorar o jeito que você treme
sempre que ouve um autor familiar ou o meu palavrão
favorito. Ela vai preencher os vãos
dos seus dedos e cobrir de beijos os buracos do seu peito.
Ela vai substituir cada aroma meu
com seus próprios erros, promessas e inseguranças.

Ela vai fazer isso. Ela vai, porque quando ela te perguntou sobre
mim,
ela sabia que eu era o seu fantasma. E no fundo
da sua consciência, você queria dizer pra ela
que os assombrados não precisam mais de exorcismo. Mas de todas as formas,
querido, ela pode tentar.

(Essa é a tradução do poema “A Poem from Your Ex Girlfriend to The New Love of Your Life”, escrito por A.A. Dizon e publicado no blog Artparasites – link: http://www.artparasites.com/a-poem-from-your-ex-girlfriend-to-the-new-love-of-your-life/)

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poeminhas, tex(perimen)tos

coringa (para M)

Você se vestiu de Darth
Vader (por favor seja meu
pai): jeans Armani e covinhas
nas costas – buraco
onde você me enterrou depois
de me laminar em postas de
sushi com o seu sabre de luz
cego. Canastra suja.

Descartaram as minhas
amídalas embebidas em
shoyu, lixo tóxico embaralhado.
Na sua corte, eu nunca
vou ser Padmé; só um bobo
bidimensional com selo
Copag.

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poeminhas, tex(perimen)tos

zoodíaco

Nascido em ano sino-suíno,
você tem idade ímpar em ano par:
sinal astral pr’a gente formar um par

(logo eu que sou de ascendente descrente).

Mas o cigano leu a sorte nas rugas da minha
mão, que sua feito um porco ao seu toque,
embora eu seja peixes, nadando num
aquário de previsões.

E se o horóscopo diz que eu vou ser feliz,
dispenso jogar minha moedinha no chafariz
substituo o meu desejo por um Matte Leão
e te ofereço um gole (prova

de amor).

Já até calculei a numerologia dos nomes
dos nossos filhos.

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poeminhas

Não se mate

Vera, sossegue, o amor
é isso que você está vendo:
hoje manda mensagem, amanhã não manda
(talvez seja hora de você puxar assunto),
depois de amanhã vira o mês,
o plano de dados da sua operadora renova,
são tantos megabytes, ninguém sabe
o que será.

Inútil ficar ansiosa
ou mesmo querer bloquear das redes sociais.
Não se mate, oh não se mate,
Reserve-se toda para
a curtida que ele vai dar na sua foto
quando curtir,
se é que vai curtir.

O amor, Vera, seu celular vibrando na bolsa,
a Noite deu follow em você,
e os recalques tuítando indiretas,
lá dentro o ruído de um áudio de WhatsApp indecifrável,
música de festa no fundo,
listas no Bloco de Notas,
selfies em espelhos,
screenshots do Instagram dos outros,
informação que ninguém sabe
de quê, praquê.

Entretanto você dá scroll down na página
cabisbaixa e blasé.
Você é a tomada, você é o aviso
de economia de energia
e o brilho de tela que diminuiu.
O amor no Mural e não no quarto
é sempre triste, minha filha, é claro,
mas não diga nada a ninguém,
ninguém sabe nem saberá.
Não se mate.

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brincando de ser séria, poeminhas, tex(perimen)tos

Steve Martin

Me visto de couro, do meu próprio corpo
Tecido adiposo pra você rasgar, a malha
mais pesada de trajar, do peso do ouro

Me enrolo em corda e te mostro a faca
Você só me solta, não faz mais nada
E isso machuca mais que qualquer facada

Tento, em vão, inverter a posição, eu quero
ser sua dominatrix, algum tipo de tentação
Mas você prefere assistir uma série no Netflix

Então ponho Lady Gaga pra tocar e te convido
pra escrever um romance ruim, você não duvida
de mim e compõe: Cinquenta tons de indiferença

Pesquiso no Google o que dói mais, se é carne ou
se é ego, quando eu me entrego mas resultado não há
pra busca que você não quis me procurar

E nem Freud explica o porquê eu sou tão
masoquista se nenhum sádico paga pra ver
Nem um sádico como você

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